terça-feira, 28 de abril de 2015

Actualização do Top-10 de maratonistas portugueses


Excelente prestação de Dulce Félix neste domingo em Londres, onde bateu o seu record pessoal por 25 segundos, terminado na 8ª posição e como a melhor não africana, fruto duma prova onde a regularidade de (muito forte) andamento foi a sua arma, como pode ser apreciado neste quadro



Com esta marca, mantém o 5º lugar no top-10 feminino mas agora a escassos segundos das 3ª e 4ª 

A relação passa a estar assim actualizada:

1.
Rosa Mota
2.23.29
Chicago
1985-10-20
2.
Jéssica Augusto
2.24.25
Londres
2014-04-13
3.
Marisa Barros
2.25.04
Yokohama
2011-02-20
4.
Manuela Machado
2.25.09
Londres
1999-04-18
5.
Dulce Félix
2.25.15
Londres
2015-04-26
6.
Sara Moreira
2.26.00
Nova Iorque
2014-11-02
7.
Albertina Dias
2.26.49
Berlim
1993-09-26
8.
Filomena Costa
2.28.00
Sevilha
2015-02-22
9.
Helena Sampaio
2.28.06
Amesterdão
2003-10-19
10.
Aurora Cunha
2.28.11
Londres
1989-04-23

Quanto ao top-10 masculino, a lista continua ordenada da seguinte forma:

1.
António Pinto
2.06.36
Londres
2000-04-16
2.
Carlos Lopes
2.07.12
Roterdão
1985-04-20
3.
Domingos Castro
2.07.51
Roterdão
1997-04-20
4.
Manuel Matias
2.08.33
Gyeongju
1994-03-20
5.
Luís Jesus
2.08.55
Paris
2006-04-09
6.
Joaquim Pinheiro
2.09.11
Otsu
1997-03-02
7.
Alberto Chaiça
2.09.25
Paris
2003-08-30
8.
Luís Novo
2.09.41
Berlim
2004-09-26
9.
Hélder Ornelas
2.09.59
Milão
2005-12-04
10.
Joaquim Silva
2.10.42
Viena
1994-04-10


sábado, 25 de abril de 2015

38ª Corrida da Liberdade - A festa da corrida em liberdade

Os 8 atletas 4 ao km presentes. Em baixo: Marta, Lúcia e Isa. Em cima: Eberhard, João Cravo, eu, Orlando e Vítor

Para quem ama a corrida e a liberdade, esta é daquelas provas a não perder. Mais do que uma corrida, é uma festa. Festa pela liberdade restaurada há 41 anos atrás e pela liberdade de correr.

Estive assim presente aqui pela 8ª vez na minha 10ª época de Atletismo. E mais uma vez, à semelhança dos últimos anos, feita sem preocupação de relógio mas em alegre convívio.

Foi a primeira corrida pós Maratona de Paris e o cansaço ainda dá algum sinal. Mais do que a Maratona, a fadiga acumulada pela semana seguinte de muitos, longos e óptimos passeios pela cidade maravilhosa. 

Assim, comecei muito devagar, em companhia da Isa e Vítor. Como particularidade, assinale-se que os 5 maratonistas de Paris dos 4 ao Km estiveram todos presentes, e o facto de com 8 atletas da equipa, termos igualado a S.Silvestre da Amadora 2013 como a prova mais participada da nossa equipa de amigos.

Como nos fomos sentindo bem, fomos acelerando entre os 4 e os 7 km. Depois apanhámos a Marta e seguimos os 4 alegremente até à meta. 

Uma excelente manhã num clima de festa e alegria tão própria duma manhã de corridas, a que até S.Pedro deu a sua ajuda pois evitou a prevista chuva..

Segue-se na 6ª feira o 1º de Maio  



segunda-feira, 20 de abril de 2015

A recompensa - 42,195 km dans la plus belle ville du monde!


00.40 de domingo. Após ter adormecido pelas 11 e tal, acordei. Ainda faltam várias horas para a partida da Maratona, uma noite inteira, mas já não viria a pegar no sono. Não por receio. Após tantos e tantos anos a sonhar com esta prova, o estar a escassas horas deixou-me o cérebro a mil.

Uma noite mal dormida não é problema. O complicado é quando se junta a outra, como a de 5ª para 6ª onde dormi apenas 3 horas pois o táxi para o aeroporto estava à porta às 4.15 da madrugada. 

6ª que foi um dia muito cansativo, pela viagem, peso das malas e quilómetros que andámos naquela feira gigantesca, autêntico outro mundo para o que estamos habituados. 
Juntando-se mais umas horas a passear por Paris no sábado e uma imaculada preparação ficou abanada em 2 dias. Mas isso não havia volta a dar e seria muito difícil ter sido evitado.

Depois de 32 km maravilhosos, entre os 32 e os 35 a coisa começou a doer, mas a aguentar bem. Aos 35 "morri", seco de energia, arrastei-me como pude até à meta. Cortada com grande emoção!

Para a história, 5.09.08 de tempo final, numa Maratona de participação record. Dos 54 mil inscritos, partiram 41.342 e chegaram 40.190, quebrando a barreira dos 40 mil, algo que apenas 2 Maratonas tinham logrado. Nova Iorque por 5 vezes e Chicago no ano passado. Nunca tal tinha sucedido na Europa. 

Este foi um pequeno resumo. Se quiserem ler a longa história completa, apertem os cintos e acompanhem-me nesta viagem memorável.


A 3 dias da viagem, um susto. Os controladores aéreos franceses estavam em greve na 4ª e 5ª, o que originou dezenas de voos cancelados. Felizmente a 6ª não era abrangida mas não sabíamos se haveria hipotéticos problemas pelos 2 anteriores dias. 

5ª feira, já de férias, dia para, calmamente, preparar e arranjar tudo. Deitar o mais cedo possível, tarefa complicada pelas coisas que aparecem sempre à última, e despertador posto para as 3, o que não foi necessário pois às 2.42 acordei (notem a particularidade do 42)

Táxi à porta à hora certa e chegada ao aeroporto onde já estava o Orlando, mulher e filha, com o Vítor a chegar logo de seguida e a Isa também. Era o grupo dos 7 que iria ocupar um apartamento para turistas, alugado em Avron (Nation), a escassos 50 metros do Metro de Avron. E com o Metro à porta, qualquer sítio é rapidamente alcançável em Paris, através das suas 14 linhas. Um emaranhado de linhas e estações mas muito facilmente entendíveis, mesmo as estações com 4 linhas.

Encontrámos depois o pré-maratonista João Cravo, com a mulher e pais, com a curiosidade que tinham marcado voo também em Maio passado e, sem ter sido nada combinado na altura, marcaram os mesmos, tanto de ida como regresso.

Os 5 maratonistas à porta de embarque
Viagem à hora certa, chegada a Paris, ver onde se apanhava o Orlybus para o centro de Paris e aí vamos nós.

Ora como íamos estar 9 dias e, habitualmente, o tempo é fresco/frio nesta altura na cidade-luz, as malas iam cheias de roupa, a maior parte quente. Mal imaginávamos que iríamos apanhar verão na primavera (4ª, onde passámos o dia em Versalhes, chegou-se aos 30 graus!). 
Foi assim um certo esforço para subir e descer as diversas escadas do Metro, em especial com uma mala que parecia levar ferro.    

Mas lá chegámos ao destino. Tempo apenas para deixar as malas no apartamento e rumar de imediato à Feira pois enquanto não tivéssemos os dorsais na mão, não descansávamos!

Um tamanho brutal! Um mundo completamente diferente do que estamos habituados. Andámos umas 3 horas por lá, para conseguir ver tudo. E almoçámos na Pasta Party. Estava boa mas não chegava à que foi a do Porto em Novembro passado.

Claro que o primeiro passo, e aliás o percurso da feira a isso obrigava, foi levantar os dorsais. Primeiro passar pela entrega e confirmação dos certificados médicos. Sem o carimbo que colocavam a certificar, não havia dorsal para ninguém.

Muitos e muitos guichets, divididos por números, e aí estou eu a receber o dorsal 59295. Devo confessar que tive que controlar uma certa emoção. E o caso não era para menos, tinha o tão sonhado dorsal na mão. Agora, "bastava" correr os 42,195 km na mais bela cidade do mundo, como os organizadores justamente intitularam esta prova (como coloquei no título deste artigo em língua original).

Este já ninguém mo tira!
Tempo para descobrir o nome num enorme mural com todos os inscritos, deixar uma mensagem num outro mural colocado para esse fim, e derrubar o muro dos 30 no stand da Isostar, devidamente equipado com capacete e tudo (notem a cor do capacete).

O enorme mural com o nome de todos

Tou aqui!

Escrever uma mensagem


Derrubar um muro aos 30 (Este não custou nada. Aos 35...)

Todos "dorsalados" 
Muitos stands de Maratonas, com a do Porto presente. Falámos com o filho do Jorge Teixeira e ficámos a saber que este ano a Maratona da Invicta terá partida e chegada no mesmo local, Parque da Cidade, no Queimódromo, o que é (mais) uma mais valia para esta prova de sucesso.

Sábado foi o único dia que esteve mais fresco e caíram uns pingos. As previsões para o domingo 12 cumpriram-se. Sol e a temperatura a ir do acordar fresco da manhã ao calor (mas no limite do suportável).

E foi assim que chegou o grande dia! Na véspera, muitas mensagens de força. Entre os quais um telefonema da Sandra e do Nuno, com muitas perguntas sobre a que horas sairíamos, etc. A Sandra confessou a sua pena de não presenciar, pela primeira vez, uma Maratona minha.

Tínhamos combinado sair às 7.10 para apanhar a linha 2 (Avron) até Nation (uma estação de distância) e aí apanhar a linha 6 que começa em Nation e vai acabar na Charles de Gaulle Étoille, exactamente a estação que fica ao pé do Arco do Triunfo e no início dos Champs Élysées, onde a Maratona ia começar.

Fui à casa de banho e ao regressar à sala noto que o telemóvel tinha tocado. Tinha sido a Sandra. Eram 7 horas, 6 em Portugal. Comentei que ela até tinha acordado a essa hora para nos desejar boa sorte! Liguei-lhe e perguntei-lhe o que estava a fazer já acordada. Riu-se e perguntou se já estávamos no Metro. Não, estamos para sair. Despediu-se então com um rápido "Boa corrida a todos!" e desligou. Estranhei estar a ligar a essa hora para um tão rápido telefonema mas provavelmente devia pensar que estávamos com pressa.

E assim à hora combinada saímos com a controlada excitação de quem tem um enorme desafio pela frente. 

Eu e a Isa fomos os primeiros a chegar à porta da rua e sair e... de repente... UM CHOQUE (dos bons). Uma ENORME surpresa que nos deixou boquiabertos (e a mim sem reacção). Vejam as fotografias:



A Sandra com uma bandeira de Portugal e o Nuno a registar este momento!!!

Tive ali um segundo de confusão. Mas acabei de falar com ela que estava em Corroios... Passado esse segundo, caí na realidade. Tinham chegado na véspera para nos fazerem esta maravilhosa surpresa e apoiarem-nos na Maratona. 
Sem palavras, como podem calcular! :)

Em vez de 7, seguimos assim 9 no Metro (com 7 ainda a não conseguirem acreditar no que tinha sucedido!).


Na estação, a expectativa foi aumentando à medida que nos aproximávamos dos últimos degraus. Estávamos quase a chegar ao local de partida da mítica Maratona de Paris! 

E a primeira imagem, o monumental Arco do Triunfo a transmitir-nos força. 

Com o Arco do Triunfo ao fundo e a incansável fotógrafa Mafalda a apanhar 4 atletas 4 ao Km
Pouco depois chega o João Cravo e família. Éramos agora 13 e a ansiedade fervilhava. Ouvimos ao longe a partida da elite.

Agora já com o João Cravo mas sem o Orlando que já tinha ido para a sua partida
A Maratona de Paris tem 9 partidas diferentes, para impedir a grande aglomeração de atletas. Como na saída 9 (mais de 4.30 de tempo), éramos muitos, dividiram em duas. Como estávamos no lado direito, fomos os últimos a partir, hora e meia depois dos quenianos, numa altura que o primeiro passava por volta da trintena de quilómetros. Primeiro, Mark Korir, que fez história pois foi a primeira vez que o vencedor foi mais rápido na 2ª metade do que na 1ª. Facto impressionante tendo em conta que esta foi a 39ª edição e que confirma a primeira metade como mais fácil.

Hora e meia de espera pode parecer muito mas o tempo voou. Ao entrarmos no nosso espaço de partida, encontrámos o Henrique Vilhena e o Pinho. Pouco depois juntou-se a nós o Manuel Arons de Carvalho, uma grande referência no nosso Atletismo.

Se o record de participação de atletas 4 ao Km numa Maratona era de 4, em Sevilha 2014, aqui passou a 5. Nessa altura já o Orlando corria (partiu às 9.30) para a sua 13ª Maratona. Prontos a partir, Isa, Vítor e eu para a nossa 4ª e o João Cravo para a sua estreia.

Vimos os do lado esquerdo arrancarem e só queríamos também desatar a correr Champs Élysées abaixo. O que finalmente aconteceu! Precisamente 1 minuto após a partida, estávamos a cruzar o tapete de partida.

Estava onde sempre tinha sonhado, na Maratona de Paris! Mas não me deixei levar pelo entusiasmo nem pelos 2 quilómetros iniciais a descer. Ritmo controlado e estudado. Muito estudado! E sim, desta vez, posso já adiantar, fui um verdadeiro relógio suiço até aos 35 km. Apenas muito ligeiros segundos de diferença entre cada quilómetro. Plano levado a rigor.

Chegados à Concórdia, uma praça monumental (em Paris é tudo "à grande e à francesa"!), seguimos para a Rivoli, passando ao lado das idílicas Tuileries e Museu do Louvre em direcção à Bastilha. 

Seguia com o João Cravo, que ia muito bem, enquanto a Isa e o Vítor ficaram para trás para a Isa ir a uma casa de banho. 

Abro aqui um parênteses para confessar algo. Após o que me sucedeu na falhada Rock'n'Roll Maratona de Lisboa 2013, é um grande alívio fazer os primeiros metros e sentir as pernas bem. Há fantasmas que nos atormentam, talvez por já terem sido reais e não ficcionais.

Aos 5 km e muito bem dispostos. Uma constante comigo até aos 35 
Na Bastilha as primeiras caras conhecidas no público, a família Cravo. E lá continuámos bem e felizes, agora em direcção ao Bosque de Vincennes onde iríamos correr entre os 9 e os 19 km pela estrada que o circunda.

Após a Isa, foi altura do João Cravo sentir o apelo duma casa de banho. Não sabendo se iria encontrar brevemente uma, foi atrás duma árvore. Tal como tínhamos combinado previamente em treinos, se tal sucedesse a algum, o outro seguia um pouco mais devagar até o outro o apanhar, já que parar não é bom para o ritmo. E foi assim que se fez. Eu segui e quase logo de seguida rio ao ver casas de banho na berma da estrada. Afinal não tinha sido preciso uma casa de banho com tronco à volta.

Vou olhando para trás e começo a perceber que não vai dar. Essa táctica poderia ser boa para a nossa realidade onde o pelotão vai-se alongando, mas ali, a qualquer momento da corrida, vamos sempre rodeados duma multidão e, infelizmente, tinha perdido o João, no que teria sido uma preciosa ajuda para ambos. 

Aos 12, após passar o Castelo de Vincennes, encontro a Sandra e o Nuno. Dou um hi5 a cada e digo "fantastique", palavra com duplo significado. O que estava a ser fantástica a minha prova e o fantástico de estar a correr nesta cidade de sonho.

Aos 15 em Vincennes. Palavras para quê? É um atleta feliz em plena corrida
Após sair do Bosque de Vincennes, regresso à Bastilha onde torno a encontrar a Sandra e o Nuno que me diz que vou muito bem (e ia!) e após a praça a família Cravo. Altura de cortar para a estrada que segue junto ao Sena, vendo do outro lado a Conciergerie e Notre Dame. Esta parte até sair junto do Sena foi onde mais público incentivou os milhares de maratonistas presentes.

E se já tínhamos passado por muitas bandas, a partir daqui a média era duma em cada 400 metros. Todos os estilos presentes, desde mais clássico, samba, rock, tudo o que imaginarem. Ainda em Vincennes um cantor que fazia rir todos os que percebem francês, ao cantar em tom depressivo/cómico uma letra com os seguintes dizeres "Mas porque estou aqui a correr? Estava tão bem deitado no meu sofá a descansar. Ai que bem que me sabia agora um banho e uma massagem", e por aí fora.

Começam os túneis. Contei 3 ou 4 (a dúvida é se um pode ser considerado túnel pelo seu escasso tamanho). O maior, com cerca de 800 metros mas com animação. Ecrans gigantes, música e raios laser. Além do som respeitoso das turbinas de refrigeração. E esta foi a única altura que o tempo registado no relógio em cada km não foi semelhante aos anteriores pois o GPS parou nos 25 e tal, só retomando à saída onde fez o acerto, dando esse km como 10 minutos. Como passado um pouco cheguei aos 27, esse ficou registado como 3.14, eh eh. Posso dizer que tenho um km registado em Maratona como 3.14, e já aos 27 km!

Após os túneis, por volta dos 28. A disposição continua intacta
Aos 28, passo ao lado da Mafalda, conseguindo ir até ao passeio, dar-lhe um beijo e prosseguir, tudo sem perder ritmo. Foi mais um boost!

Altura de passar ao lado do monumento mais engenhosamente fantástico que já pude apreciar, a Torre Eiffel. E depois a marca dos 30 km. E eu a continuar bem! Nunca tinha chegado tão longe numa Maratona sempre a dar-lhe e sempre a sentir-me bem. O que sucedeu até aos 32 km, altura em que o cansaço fez menção de me lembrar que também estava presente. Comecei a sentir algumas naturais dificuldades mas a conseguir aguentar. 

A última etapa estava aí. Entrar no Bosque de Bolonha aos 34 e ao sair, curvar para a esquerda, depois direita, ver a placa dos 42 e a meta a 195 metros. Era o que me faltava. Mal imaginava o quanto faltava!

À entrada do Bosque torno a ver a família Cravo. Já não respondo com sorriso de orelha a orelha mas a manifestar cansaço. Sempre controlado.

Até que faço uma curva à esquerda, seguindo-se uma ligeira subida em curva à direita. A subida não era nada de especial mas chego lá acima e... "morri!". Não, não foi muro. Muro parece que acabou tudo mas depois passa. Ali senti que tinha ficado de repente seco de qualquer energia, que não iria regressar, não tinha força para mais, além da força mental de querer seguir. Nesse preciso momento dou de caras com a Sandra e Nuno, devidamente equipados, que queriam acompanhar-me nestes 7 km finais pelo Bosque de Bolonha.

A pena que tenho não ter podido aproveitar devidamente a sua preciosa companhia, mas a verdade é que sentia-me "morto". E aplico esta palavra porque foi a primeira que me veio à cabeça quando cheguei ao pé deles, respondendo à sua pergunta de como estava com "morri!"

36º km e a "morrer"

É isso, olhar em frente que a meta há-de aparecer

A bufar

Que cara é essa?
Há que seguir sempre. Doa o que doer
Para piorar a situação, entrámos num período de longas rectas, daquelas de perder de vista. Primeiro que chegasse o quilómetro seguinte era o cabo dos trabalhos. Aos 39 a maior crise. A Sandra diz-me que já se vê a placa dos 39 e faltam apenas 3. Mas 3 nessa altura é uma Ultra! Digo que estou morto, que não posso mais (além daqueles disparates que se dizem nestas alturas, estilo "já devia saber que não fui feito para isto", etc). O Nuno responde-me que também lhe disse aos 35 que estava morto e já vou nos 39. Tenta picar-me apontando uma atleta que vai à frente "Olha aquela gorda. Vais dizer-me que não a vais passar, que ficas atrás dela?". Ao que eu respondo "Quero lá saber da gorda!!!". Peço-lhe para não me dizer mais nada após outras suas tentativas para me despertar. Sei que o Nuno estava a fazer tudo o que em condições normais seria o ideal mas nesta altura nada funcionava. Nunca mais via o fundo ao tacho e receava nem o ver, apesar de estar sempre a avançar rumo à meta. Apenas queria ver aquela curva à esquerda e direita.

A maior crise. Km 39. Estava a ver a coisa mal parada
Muitas placas desenhadas no chão com dizeres bem motivantes mas nada funcionava. Nem o passar o km 41. Ainda faltava muito.

Não é já o 41. Ainda é só o 41!
Para alguém como eu, cada Maratona é um enorme desafio, a que dou tudo o que tenho. Por isso, o concluir é duma emoção que não consigo reprimir. E a emoção desta chegou a 500 metros da meta com o som duma música.

Foi o último grupo por onde passámos e estava a tocar o "Let the sunshine in" da Ópera rock Hair. Uma música com muito significado próprio da altura. Para quem não a conhece, clique aqui.  

Vinha a ouvi-la e começo a cheirar a meta. A aperceber-me que vou conseguir. E quando chega o momento da música que pode ser ouvida na ligação acima ao minuto 3.08, quebrei emocionalmente. Um simples refrão que veio desencadear tudo o que já estava em turbilhão.

A Sandra vem dar-me um abraço. Pouco mais à frente saem da estrada, para eu seguir para a meta, deixando-me a bandeira de Portugal. 

Acabei de me despedir da Sandra e Nuno. A emoção toma-me de assalto. estou a uns escassos 400 metros da meta
Estou na sonhada curva à esquerda e logo de seguida à direita. De repente, sinto-me a planar pelas nuvens dum sonho, passo a placa do km 42, avisto a meta. Desperto com ameaças de cãibra na perna direita. Coloco-a mais de lado e penso para mim mesmo "agora não, agora não". 

Vou conseguir!
A meta vai crescendo aos meus olhos. Está mesmo à minha frente! Ergo a bandeira e cruzo-a. Sou tetra-maratonista e em Paris!!!

Legendas desnecessárias!
Baixo os braços com a bandeira mas torno-os a levantar com um grito interior. Vejo a Mafalda do lado direito e a chegarem a Sandra e o Nuno.

Vou andando. Recebo a camisola de Finisher. Recebo a medalha. Beijo-a. Após a água e maçã, fico à espera dos meus colegas. Estava um pouco apreensivo por a Isa e o Vítor não me terem passado e não sabia nada deles e do João Cravo (nesta prova nunca nos cruzamos por isso não dá para ver).

O meu relógio marca 5.10 mas sabia que devia ter sido 5.09 qualquer coisa, pois com a emoção da chegada e com a bandeira na mão, não desliguei logo o relógio.
Curiosamente, as minhas 4 Maratonas decorreram todas de forma muito diferente, incomparáveis, mas concluí-as a todas entre um pequeno intervalo de tempo (5.02 a 5.11).

8 minutos depois, chegam a Isa e o Vítor. Cansados mas felizes. Abraçamo-nos mas o momento logo é interrompido com o chamamento da Mafalda, com a mulher e filha do Orlando ao lado com ar de muita preocupação e aflição.

Ninguém sabia do Orlando. Só o tinham visto aos 27, não sabiam mais nada, se teria chegado ou não. Se sim, onde estava? Se não, o que sucedeu? Em condições normais teria feito menos uma hora do que eu e tendo partido 45 minutos antes, há quase 2 horas que deveria estar ali mas nem sombra dele no ponto de encontro combinado caso nos desencontrássemos (entrada da estação de Metro de Porte Dauphine)

Ainda dentro do espaço da chegada, vou até à Cruz Vermelha. Consultam os dados e não, não tinham assistido ninguém com esse dorsal nem tinham qualquer indicação de o ter sido durante a prova. Dirijo-me às massagens. Mais de cem camas com pessoal a ser massajado e outros tantos à espera. A cancela está fechada pois já não podem receber mais ninguém. Digo que não vou às massagens mas apenas procurar um amigo. De imediato abrem a cancela. Percorro tudo de lés e lés e nada de Orlando. 

A Sandra e o Nuno lembram-se de ir até ao local da partida (distante de mais dum quilómetro).
E vem por telemóvel a boa nova. Deram com o Orlando! Baralhou a estação de metro com o nome da avenida da chegada e andava à procura duma estação de metro Foch que não existia...

Tudo está bem quando acaba bem, e melhor ficou quando vimos o João Cravo chegar e tornar-se Maratonista!!!

No final, todos felizes! 

Todos medalhados! Todos conseguimos! Fantástica equipa! 
Altura de regressar e recebermos mais um fantástico desenho personalizado do Nuno que não regateia esforços a dar-nos estes mimos bem valiosos!!!

Um grande artista, um grande amigo. Obrigado Nuno!
Começo a receber diversas mensagens mas estranho muitas referirem frases estilo "o que interessa é acabar, não te preocupes com o tempo" e até algumas a dizerem para não desanimar! Mas fiz o tempo habitual... Depois percebi. Enquanto todos estavam na classificação com o seu tempo real, eu estava com 6.40.08, como se tivesse partido logo com os quenianos!
Contactei a organização que foi célere a responder, justificando que 0,2% (2 em cada mil) chips não tinham registado o tempo da partida (provavelmente com o elevado número de passagens simultâneas), estavam assim desde o início da prova e que iriam investigar o tempo correcto (penso que por imagens da partida).

Entretanto, nesse dia e nos seguintes, o Jorge Branco não se cansava em ir fazendo a ponte entre mim e Portugal, dando todas essas informações. Finalmente, no sábado, estávamos nós no Castelo de Vincennes, recebo um seu sms informando-me que já aparecia 5.09.08 (lá está, 1 minuto exacto após a partida, dada 1.30 após os primeiros, o que somava os tais iniciais 6.40.08).

Como curiosidade, o meu lugar foi o 35.832º, terminando à frente dum pelotão superior a todos os classificados na nossa Maratona do Porto, detentora do record nacional com 4.041, podendo aferir-se com este pequeno pormenor como é gigantesca a participação nesta Maratona, a maior de sempre na Europa.

Andámos um bocado a seguir à Maratona e quando fomos ao mix almoçar/jantar as pernas pareciam boas. Fiquei cerca duma hora sentado e quando me levantei e até ao apartamento, tive uma série de cãibras em muitos locais diferentes nas pernas. Foi muito doloroso e tive várias em diversas sítios onde nunca tinha sentido. Apenas os gémeos se livraram.
Mais do que o cansaço dos dois últimos dias e o quase não ter dormido, penso que a maior fatia de responsabilidade adveio de ter bebido pouca água nessas 48 horas antes, ao contrário do habitual.

Depois... bem, depois foi passar uma semana inteira a andar muito, alguns dias com cerca de 10 horas, subir muitas escadas em caracol, para aproveitar tudo o que esta maravilhosa cidade tem para ofertar.
Já nem sentíamos pernas e pés mas quem se importa com isso quando há tanto para desfrutar?

4 finishers em Versalhes (pelos meus olhos vejam o que estava aflito com o sol. Lá atrás, entre mim e a Isa, era a varanda do auto-proclamado Rei Sol, Luís XIV)

Olhem só o estilo de 3 finishers junto à Torre Eiffel!

4 amigos com o quadro mais famoso do mundo, a Careca, desculpem enganei-me, a Mona Lisa

Só me falta um capacete na mão para ficar mesmo com ar de piloto de Formula 1
E no sábado, após 9 maravilhosos e inesquecíveis dias, foi a altura de regressar ao final da noite. Na chegada a surpresa da presença dos pais da Isa e do casal Isaac que fizeram questão de estarem presentes. Mas com o cansaço com que chegámos, nem uma fotografia nos lembrámos de tirar... o que foi uma pena.

A todos os que conseguiram chegar aqui, lendo tudo, parabéns! São uns Maratonistas de leitura!

A todos aqueles que sabem perfeitamente quem são, o meu eterno agradecimento por tudo.  

ps - Faltam 181 dias para a Rock'n'Roll Maratona de Lisboa (a tal que tenho que ajustar contas!)

Obrigado!

Paris, uma paixão de cidade, uma cidade de paixões!