segunda-feira, 25 de setembro de 2023

Bater o proclamado limite humano

 


Sendo o Atletismo uma modalidade multi-disciplinar, multi-género e multi-escalão, conta com muitos records mundiais. Todo e qualquer um é fantástico pois significa que alguém fez o que nunca tinha sido efectuado por qualquer um dos milhares de atletas mundiais.

Mas sendo qualquer um fantástico, alguns ganham uma mística especial por razões como a quebra de alguma barreira, seja cronométrica ou distância, ou pela diferença alcançada em relação à anterior marca.

Um dos míticos foi, durante exactamente 16 anos e meio (Londres, 13 de Abril de 2003 a 13 de Outubro de 2019 em Chicago), o record mundial feminino da Maratona.

Paula Radcliffe alcançou na Maratona de Londres de há 20 anos atrás, uma marca inacreditável para a época, 2:15:25, batendo por 1 minuto e 53 segundos o anterior record e colocando a fasquia de tal forma que durante mais de 15 anos ninguém se aproximou, poucos conseguiram o minuto 17, nenhuma o 16.

Nesse referido dia de 2019, um mito caiu. Brigid Kosgei parou o cronómetro em 2:14:04 e espantou o mundo! Afinal o record de Paula Radcliffe era humano e tinha sido batido.

Desde ontem, e após a Maratona de Berlim, como classificar o que a etíope Tigst Assefa alcançou? Não só bateu a inacreditável marca de Kosgei que tinha derrubado a mítica marca de Radcliffe, como o fez pela estonteante diferença de 2 minutos e 11 segundos! 

2:11:53 passou a ser a marca que encima a tabela mundial feminina. 

E é abaixo de 2:12:11... E porquê esta referência de tempo? Porque quando o célebre Abebe Bikila venceu a Maratona Olímpica de Tóquio 1964, repetindo a vitória de Roma 1960, registou esse tempo, novo record mundial por 1 minuto e 44 segundos.

Um conjunto de médicos, fisiologistas e cientistas reuniram-se então, estudaram todos os parâmetros, analisaram todas as premissas e concluíram que, com essa marca, tinha sido alcançado o limite humano!

Quase 60 anos depois, sabemos que a nível masculino essa marca já desceu mais de 11 minutos (11.02) e agora foi a vez do sector feminino derrubar também esse limite.

Sector feminino que nesse ano de 1964 não podia ultrapassar os 800 metros (400 entre 1928 e 1960), só em 1972 os 1.500 metros e nos anos 80 tudo se normalizou, com a primeira Maratona feminina oficial a ser disputada em 1982, no Europeu de Atenas e a vitória duma tal de Rosa Mota!
Nunca é demais recordar que, para esse impedimento, "especialistas" consideraram que tais distâncias eram demasiado para o "frágil" corpo duma mulher, com justificações "científicas" como correrem distâncias dessas poderiam provocar a queda do útero (!!!).

Sem nada de tão radical lhe ter sucedido... Tigst Assefa ontem também destruiu a proclamação de 1964 sobre o limite humano.


E ainda voltando à tal "fragilidade feminina", o que se prova é que quanto maior for a distância, mais a mulher se aproxima do homem. Por outras palavras, quanto mais resistência e menos explosão for necessário, mais as atletas femininas aproximam-se.
Atente-se no quadro seguinte onde constam os records mundiais das distâncias mais significativas, a partir dos mil metros, tendo na última coluna a percentagem de quanto a marca feminina está acima em relação à masculina.
Como se pode constatar, quanto maior a distância, menos diferença há!



Um comentário:

  1. Muito interessante a tua análise, João. Leva-nos a pensar qual será mesmo o limite humano...

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